Assim você consegue melhorar o manejo. Confira o artigo de Enrico Ortolani
Enrico Ortolani *
Am
A vida universitária me proporcionou conhecer e até conviver com mais
de mil pesquisadores que trabalham com ruminantes. A diversidade é
enorme. Cada um deles tem seu ponto de vista, maneira de pensar, agir e
ser, assim como excentricidades e manias.
A cientista norte-americana Temple Grandin, especialista em
comportamento animal, estaria obrigatoriamente entre os cinco mais
destacados. Ela é uma figurinha à parte. Se veste como um caubói, fala
um inglês acaipirado e tem uma vida toda particular pelo fato de
apresentar autismo parcial, doença nervosa que dificulta o
relacionamento social, interfere na comunicação oral e pode levar a
pessoa a ter comportamento restrito, se isolando do mundo.
Mas nem tudo é ruim no autismo, pois um em cada dez autistas tem
habilidades especiais que pessoas normais não possuem, como memorizar
dezenas de livros, fazer cálculos matemáticos mirabolantes, pintar
imagens após vê-las uma única vez e enxergar e ter sensações anormais.
Grandin desenvolveu essa última habilidade.
Desde garota conviveu com animais, em especial bovinos, e passou a
entendê-los de forma incrível. Dentre as suas observações, notou que,
para enxergarmos da forma como o bovino vê, temos de ficar ajoelhados
(se for uma rês adulta) ou de cócoras (se for um bezerro). Ela estava
certa. Explicaremos em seguida o motivo.
Comparado com os homens, os bovinos nasceram com os olhos mais expostos
e projetados para fora e mais posicionados no lado externo da face.
Isso faz com que o gado tenha uma visão panorâmica de 300 graus,
enquanto a do homem tem apenas 180 graus.
A natureza foi sábia e fez os bois assim para que eles pudessem
perceber a chegada lateral e evitar o máximo possível o ataque de
animais predadores. Notei que no gado Zebu essa visão lateral (40
metros), que leva a uma reação de fuga ou de reunião com seu grupo, é o
dobro da dos taurinos. Bem, para ter essa vantagem visual, os bovinos
tiveram que pagar um alto preço.
Cabeça baixa - Essa visão panorâmica é máxima e mais
clara quando o bovino está de cabeça baixa, como se estivesse pastando.
Porém, quando a cabeça se levanta, ele enxerga pior e só consegue ter
visão binocular num ângulo de 20 a 30 graus bem à frente de sua cabeça.
Ou seja, aí ele pode ver claramente um objeto com os dois olhos numa
única imagem. Lateral a essa área, o boi vê os objetos como manchas,
como se tivesse miopia. A visão binocular está relacionada à habilidade
de perceber profundidade, capacidade de calcular distância e velocidade.
A dificuldade de visão lateral do boi pode ser percebida no seu
comportamento. Para aumentar a visão do terreno onde pisa, ele caminha
balançando levemente a cabeça, para deslocar a área de visão binocular e
assim melhorar a percepção de profundidade do piso.
Outro fato importante na lida. Quando o boi entra no brete e vê, lá na
frente, no piso, uma fenda ou sombra, não consegue distinguir se é um
buraquinho ou uma vala profunda. Essa imprecisão faz com que ele empaque
e baixe a cabeça para tentar distinguir melhor o objeto.
Não adianta bater ou dar choque nele para que desempaque imediatamente.
Enquanto ele não sentir segurança e certeza ele não reagirá. Para
ajudar o boi a caminhar melhor no brete deixe o chão planinho, sem a
presença de pedras, paus ou outros obstáculos. Para não dispersá-lo a
olhar de lado e empacar ao ver movimento de pessoas ou animais, feche
completamente as laterais do brete para que ele se concentre só na linha
de frente.
Reações lentas - As reações do bovino para focar objetos são mais lentas do que as nossas. A focalização de objetos muito próximos ou distantes é feita por uma lente gelatinosa e muito flexível dentro dos olhos denominada cristalino. Para um foco próximo, a musculatura que circunda o cristalino se contrai e muda a forma deste órgão, permitindo um foco detalhado. Para focar mais distante, a musculatura relaxa. No homem essa musculatura é muito desenvolvida e reage rapidamente, mas, no bovino, a reação é bem mais lenta, diminuindo sua capacidade de focar e identificar o que está vendo. E dá-lhe maior tendência ao empacamento.
Reações lentas - As reações do bovino para focar objetos são mais lentas do que as nossas. A focalização de objetos muito próximos ou distantes é feita por uma lente gelatinosa e muito flexível dentro dos olhos denominada cristalino. Para um foco próximo, a musculatura que circunda o cristalino se contrai e muda a forma deste órgão, permitindo um foco detalhado. Para focar mais distante, a musculatura relaxa. No homem essa musculatura é muito desenvolvida e reage rapidamente, mas, no bovino, a reação é bem mais lenta, diminuindo sua capacidade de focar e identificar o que está vendo. E dá-lhe maior tendência ao empacamento.
A reação do bovino à luz é outro fator importante na lida. O controle
da entrada de luz dentro do olho é dado por uma musculatura que abre e
fecha a pupila (a menina dos olhos), um buraquinho negro no centro do
olho. No homem, a pupila é pequena e redondinha; no boi, ela é grande e
ovalada.
A musculatura da pupila no homem é eficiente e de rápida reação, mas no
bovino é ineficiente e vagarosa. Assim, contrastes de luz produzem
reações lentas no gado, que tendem a empacar, se saem de um ambiente com
luz forte (lugar ensolarado) para entrar num local mal iluminado (brete
coberto). Em locais assim, recomenda-se colocar uma luz fosca no teto
na entrada do brete para quebrar esse contraste de luz.
Temple Grandin viu o que não víamos e nos ensinou a ser bovinos para
conviver melhor com eles. A fim de facilitar o manejo na fazenda, passe
agora a enxergar como um boi e dê tempo ao tempo para que ele reaja e
manifeste sua resposta visual. Você consegue?
*Professor de clínica de ruminantes na FMVZ-USP
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